Em agosto de 2005, uma tragédia abalou o sul do Estado de Santa Catarina, mais precisamente o município de Içara. O desmoronamento de um prédio onde funcionava a sede regional da EBCT - Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos provocou o óbito de quatro pessoas e ferimentos graves em outras dez. Vários laudos técnicos foram feitos, entre eles uma vistoria feita por profissionais a pedido do Crea, constatando-se que o problema deveu-se a erros de projeto, execução e uso inadequado de materiais de construção.
O engenheiro responsável técnico pela obra foi indiciado por homicídio culposo, pelo fato de ter sido o responsável técnico pela obra. Em outubro de 2008, o juiz da 2ª Vara Criminal da Comarca de Içara condenou-o ao pagamento de uma indenização de 50 salários mínimos a cada vítima do acidente, mais 300 salários mínimos a cada descendente direto das vítimas, além da prestação de serviços comunitários pelo prazo de dois anos e oito meses (Diário Catarinense, edição de 15.10.08).
Ressaltam da sentença as absolvições do mestre de obras e do proprietário do prédio, já que, como leigos, não poderiam ter os conhecimentos técnicos necessários para analisar se tanto o projeto quanto a execução seguiram as normas técnicas aplicáveis. O dono do prédio contratou um profissional habilitado para assumir toda a responsabilidade técnica pelo empreendimento, cabendo a este adotar as medidas necessárias para sua correta execução.
Muitos profissionais do nosso Sistema ainda não se deram conta da importância da ART - Anotação de Responsabilidade Técnica junto ao Crea. Não é apenas mais um “papel” ou “uma taxa”, como muitos preferem pensar. Trata-se de importante instrumento para assegurar à sociedade que determinado empreendimento de engenharia, arquitetura ou agronomia se encontra sob a supervisão de um profissional que detém conhecimentos especializados. Por conta disso, este assume os riscos oriundos da má execução ou a responsabilidade pelos danos que o empreendimento causar a terceiros, como dispõe o artigo 186 do Código Civil.
É recorrente no nosso estado uma situação que causa preocupação. Trata-se da instalação de palcos ou estruturas destinadas à realização de eventos artísticos, esportivos, religiosos e culturais, muitas vezes tendo que suportar milhares de pessoas ou toneladas de equipamentos, além de estruturas de iluminação, geradores etc. A fiscalização do Crea está atenta a esse tipo de obra, exigindo a ART do profissional responsável pela montagem das estruturas.
Infelizmente, muitos profissionais ainda insistem em anotar a ART sem participar efetivamente da montagem das estruturas, confiando em pessoal não qualificado ou legalmente habilitado e, pior ainda, torcendo para que acidentes não venham a ocorrer. Já constatamos casos em que os profissionais responsáveis técnicos residem em municípios muito distantes do local da montagem das estruturas, não comparecendo ao local da obra para se assegurar de que tudo foi feito de acordo com as normas aplicáveis. Até laudos de vistoria antes de a obra ficar pronta nossa fiscalização já encontrou. Alguns processos disciplinares por infração ao código de ética encontram-se tramitando no Conselho, sujeitando os profissionais às penalidades previstas no art. 71 da Lei 5.194/66.
Está na hora dos profissionais do nosso Sistema se conscientizarem de que é fundamental sua efetiva participação nas obras e serviços técnicos, evitando anotar a ART apenas para “satisfazer” o Crea.
Se, ou quando, ocorrer uma fatalidade, o profissional será responsabilizado civil e criminalmente, constatando da pior maneira possível que o acobertamento não vale a pena.
Claude Pasteur de Andrade Faria
Eng. Eletric. e Bel. em Direito
CREA-SC 008958-4
Superintendente do CREA-SC
claude@crea-sc.org.br